27 dezembro 2009

os amigos

como são importantes os amigos
só há pouco tempo descobri como andei distraída sem perceber que tinha tantos
cada um com a sua história, o seu mundo que em alguma parte encaixa no meu
isso faz com que eu me sinta especial
por causa desses tantos amigos e amigas, que eu não sabia que tinha, desconfio que sou uma pessoa melhor e isso faz-me sentir muito bem.

25 dezembro 2009

dias felizes



estes dias são pequeninos
escuros e frios
mas
os mesmos dias
pequeninos
escuros e frios
só porque aqui estás,
ficam grandes
cheios
brilhantes
Verões quentes
paisagens claras
de Paz.
e eu
nestes dias pequeninos
escuros e frios,
que passam a correr,
sou uma fogueira
que não se apaga
sempre a arder.

19 dezembro 2009

mensagem

os amigos são estrelas 
o seu brilho ilumina
as nossas vidas
para eles
desejamos o melhor
saúde
alegria de viver
forças
para lutar
por um mundo melhor
com PAZ
mais justo
fraterno
e
solidário

16 dezembro 2009

história de natal. fuga para a cidade











quando avistaram a ponte sobre o Tejo já a madrugada adormecia e uma claridade difusa desenhava os contornos de Lisboa. era quase véspera de natal de 1972. para trás ficava uma noite em claro, na camioneta, mais de seis horas de caminho. na cabine quatro pessoas: o motorista que espantava o sono com a própria voz, ela, apertada ao lado da mãe e o mais novo ao colo. lá atrás a mobília, coisa pouca, uma mesa de cozinha, um pequeno fogão a gás, algumas cadeiras, as camas de ferro e os colchões de lã, uma arca com cobertores e pouco mais. no meio de tudo aquilo o pai e o outro irmão. deixaram a aldeia já noite fechada, evitando discretamente a vizinhança. tomaram o caminho do castelo velho, passaram Vale de Lagarinhos e entraram na estrada. avistaram Serpa e logo depois deixaram o seu querido Guadiana e a margem esquerda. a camioneta velha e ronceira não deixava o sono pousar.
havia algum tempo que o pai não falava de outra coisa, que deviam deixar a aldeia! a ver se a pide o largava e lhe perdia o rasto de uma vez. já outros camaradas o tinham feito e dera resultado. e foi assim que abalaram para Alverca. a tia já alugara uma casa, pequena para tanta gente - já lá viviam os dois irmãos mais velhos - num pátio acanhado onde todos os vizinhos eram alentejanos. esse natal, naquela terra desconhecida em que todos se conheciam, passou e não deixou grandes lembranças. apenas foi o primeiro natal iluminado com luz eléctrica mas a ausência da lareira fazia a noite ainda mais fria e longa. talvez as noites do pai agora tivessem madrugadas serenas…

13 dezembro 2009

Família Ferroviária por Manuela Fonseca

Nasci em 30 e Novembro de 1949 – a família alargada, ferroviária, a que pertencia, entre a António José de Almeida e os becos, travessas, ruas e avenidas limítrofes, rejubilou: tinha esperado dez longos anos por mim. E, paradoxo: cheguei tarde e cheguei cedo para ver, ouvir e sentir os comboios: os números das viagens e os percursos sabidos de cor, ditos pelo meu pai e o avô Fonseca (não conheci, infelizmente, o avô Horta ou teriam sido três a referi-los).
Fui educada – criada, como então se dizia – para além do campo do Barreirense e do Ginásio-Sede, quando passou, majestoso, a existir, no Depósito de Máquinas, nas Oficinas, a observar as composições.

Os desperdícios, recursos que ajudavam à limpeza das locomotivas, acompanhavam as duas bonecas que puderam ser-me oferecidas, a Fifi e a Orquídea Maria, acarinhadas e penteadas junto aos maquinistas, fogueiros, limpadores e operários enquanto a minha mãe, cognominada Rabicha 3, corria, corria por uma impecável logística do nosso Cristiano da Fonseca Júnior.

(As mulheres do pessoal de Tracção desdobravam-se na compra, confecção e entrega dos mantimentos que enchiam os cabazes de viagem, o Barreiro-Mar – como se lêssemos assim o nome – a testemunhar a aflição da entrega da comida confeccionada: do serviço de Reserva, os companheiros iam, quase inesperadamente, partir.)

08 dezembro 2009

inquietação




caminhos velhos
antigas veredas

que vidas
passaram
por vós

que olhares
afagaram
as vossas pedras
redondas

que mãos
colocaram
as pedras
nos valados

quem sussurrou
na curva do monte

que palavras
foram ditas
certo dia

que humanos
passos
me antecederam

de quem são
estas memórias
chegando
do fim
do tempo
perpassando
o meu ser

o que sou eu

quem
sou eu

é sempre a mesma
inquietação

Vimieiro, Março 2006

07 dezembro 2009

gente povo todo o dia

Conheci o Filipe Jorge quando ele andava a escrever este livro. Eu não sabia, é claro. (nem sei se ele imaginava que algum dia viria a editá-lo). Isto foi aí nos anos de 77/78 a 80. Eu tinha 18 ou 19 e ele tinha 22 ou 23 anos. (passaram entretanto 30 anos!) Já tinha terminado o Processo Revolucionário em Curso, o famoso PREC. Mas, no Alentejo a Reforma Agrária resistia, às investidas da lei Barreto que roubava a terra àqueles que sempre a trabalharam, aos ataques diários, espancamentos e prisões, praticadas pela GNR. Nessa altura alguns, MUITOS, de nós (aqui nesta sala estão alguns) fomos revolucionários a tempo inteiro, como ele muito poeticamente escreve no seu livro. Eu acrescento ao tempo inteiro o corpo inteiro. Foi um tempo único nas vidas de todos nós, esse tempo de REVOLUÇÃO. O nosso país já foi palco de algumas revoluções, (e revoltas também) ao longo da sua história, mas há algumas que são especiais (pelo menos para mim) como 1383-85, 1640, 1910 e a nossa: 1974. Foram revoluções em que o POVO ou as mãos do povo, empurrou o carro da história, como se escreve neste livro. E nós temos a sorte de estar vivos e poder dizer que fizemos parte desse povo que, em 1974, transformou o mundo, ao transformar Portugal.
E é desse povo que nos fala Filipe Chinita. É nesse povo que nos reconhecemos, quando o poeta no poema "proposição" fala de abrir portas ao mundo, um mundo novo a ser conquistado por esse povo. Um mundo com ruas e «salas a abarrotar de gente», onde o poeta lê os anos e as vidas nos rostos marcados, nas mãos cheias de nada e de dores antigas. Mãos de trabalho ali à disposição de todos, abertas e francas, «as mãos que tudo fazem». É esta gente povo todo o dia, a quem o poeta lança as suas palavras, no poema "sou convosco". E as palavras, essas «guerrilheiras» rimam com risos e têm «sabor a pão e a revolução».
Neste livro as ideias surgem depuradas, simples de tão claras e profundas. As palavras são apenas as necessárias para dizer. Não precisam de ornamentos. (Ele próprio, o livro, é quase um objecto estético na forma como as e se apresenta).
As palavras podem ser doces cheias de «ternura alegria» e festa, ou podem ser, simplesmente pintura(s) luminosa(s) onde «o céu é de um todo azul».
São palavras feitas acções e convicções, como a preparação do «encontro de amanhã» ou a «assembleia geral» ou «essa coisa da vida e do comunismo».
Podem ser também, como a vida por vezes, muito duras e dolorosas e são-no, nos poemas "traição" e "intermediários". Aqui é a náusea perante aqueles que «cospem para o chão o asco em que vivem».

Nesta escrita, quase uma crónica do quotidiano da revolução, o poeta cresceu com ela, a Revolução, e como pessoa, quando sente que abre «pequenos mundos que sejam» e encontra-se com a poesia. E é extraordinário como a encontra, imagine-se! num «barracão de paredes rebocadas nuas» numa «lâmpada florescente, electricidade de há pouco» ou no «tecto novo coberto de esferovite».
O poeta encontra-se com a poesia na sua «vida de revolucionário(s) humaníssimo(s) de peito aberto».

Sim, tenho de o dizer, reconheci-me, muitas vezes, nestes poemas.

Obrigado ao Filipe Chinita, por este livro e pelo outro que também já saiu este ano: Cantata Pranto e Louvor em memória de Caravela e Casquinha, em co-autoria com Manuel Gusmão.

(para terminar gostava de apenas vos dizer que perdi o contacto com Filipe Jorge em 1980 e apenas voltamos a reencontra-nos este ano, na festa do avante.)

04 dezembro 2009

viver é estar aqui

[...]
. aqui
a
jantar

palavras
a
jorrarem

vinho

noite
de
aproximar
os
homens

coisa
maior

a
escrever

o
dia
a
dia

a
cantar
o
meu
povo


as
horas
duras

a
solidão
acompanhada

a
dar-mo-nos

por
inteiro

sem
esperarmos
nada

em
troca

senão

o
prazer

dessa dádiva

na
irredutível
diferença

de
cada
um

(de
nós)

sermos

um
mais

entre

os
tantos
iguais.

CHINITA, Filipe, gente povo todo o dia, edições avante, 2009, pp.178-182

02 dezembro 2009

histórias de comboios. passeio a Caxias





outra vez de comboio. os dois irmãos protestaram, revoltados, só ela é que anda de comboio! mas a mãe não podia deixá-la, era a mais nova. recordava-se ainda da última viagem, com a tia, quando o comboio passou junto à trincheira, na rua do castelo, a mãe a acenar. agora não havia ninguém. a mãe ia ali a seu lado, sentada, envolta no xaile preto. iam visitar o pai. estava a trabalhar muito longe, responderam-lhe quando perguntou porque não aparecia. e os lírios do campo, que sempre lhe trazia na alcofa, à noite. estava à sua espera, há tantos dias. o comboio deslizava veloz, deixando um rasto de nuvens de fumo que tudo cobriam. ninguém para lhe explicar que terra era esta ,ou que estação era aquela. mas reconheceu a casa enflorada, quando ouviu o revisor a anunciar: casa branca. a mãe silenciosa, a viagem aborrecida e longa. por fim, o barreiro e aquele nevoeiro mal cheiroso, que lhe picava os olhos e fazia tosse. à saída do barco, lá estava a tia chica a dar pressa. senão não chegamos a horas da visita. recordava-se vagamente de passar por um bonito jardim, onde queria apanhar flores, mas puxavam-na, sem tempo. vamos não queres ver o pai. quero. chegaram a um portão alto e escuro, um guarda de cada lado. deteve-se assustada. não vou tenho medo. e o choro, alto, ouviu-se. lá seguiram, a puxá-la por um corredor escuro e interminável. quando se deu conta estavam junto do pai, mas não podia subir para o seu colo. os bracitos, desesperadamente, tentavam afastar as grades para passar entre os ferros, como ouvira contar tantas vezes a um dos irmãos, quando fora ver o pai a serpa, mas não conseguia. não se recorda como terminou o passeio a caxias. apenas sabe que foi triste. no regresso, quando chegou ao pé dos irmãos contou-lhe que tinham passado ao tejo, ao ribatejo e ao alentejo.