o menino da praia dos amendoins
na praia dos amendoins tomava-se banho em qualquer altura do ano.
bastava uma pessoa querer, mesmo que o sol aquecesse pouco... até nos dias invernosos, quando um vento fininho, de norte, soprava afiado, como gumes de facas amoladas enfiando-se debaixo da pele... ainda assim,os rapazes, destemidos, iam ao banho.
sapatos (quem os não tinha era menos esse trabalho), calças, camisolas e cuecas voavam pelos ares. os corpos franzinos, em pelota, arrepiados. como se todos os grãos de areia da praia tivessem voado para se colar à pele.
desatavam-se todos os nós nas pernas e a corrida só terminava quando a água, gelada, roçava a virilha. mergulho rápido e toca a fugir.
a praia dos amendoins fica mesmo ao lado do
porto da cuf. é um minúsculo areal amarelado, continuamente lavado por um sal de sabor desconhecido, que a torna daquela cor.
em certos dias, a praia dos amendoins fica envolta em bruma cinzenta e tem o cheiro dos ovos podres, quando se partem (como quando o menino os vai buscar à estação do barreiro-a,na pasteleira. os ovos vêm do algarve, envoltos em palha, dentro de cestos de cana) e a água fica cor de prata e os corpos prateados, brilham...
a pasteleira. transportava ovos, que se vendiam para a pastelaria da dona zulmira, para o sr. real e outras casas do barreiro
às vezes, as sirenes dos barcos dos
amendoins acordavam o menino mais cedo. saltava da cama, vestindo-se à pressa. a
mãe já saira, com os ovos para o mercado, o pai não se sabe quando volta... que
uma máquina a vapor tem lá os seus caprichos e se lhe dá para avariar na serra do algarve... não se pode adivinhar quando chegará ao barreiro.
2 comentários:
Gostei de ler, de conhecer este blog, o menino da praia dos amendoins, as memórias que habitam a alma, que alimentam as palavras. Vou acompanhar.
grata pelo comentário, lectorwall. é bom saber que alguém leu e gostou.
obrigado pela companhia. :)
rc
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